A cultura da
empresa familiar
A existência de uma história e um patrimônio econômico comum aos membros da família empresária, assim como o envolvimento dela na gestão e na governança da empresa familiar, duas das suas principais características, contribuem para o desenvolvimento de uma cultura, de princípios e de valores.
O avanço nos conhecimentos sobre administração estratégica mostra a influência que a existência de uma empresa, pois as pessoas da organização vivem essa cultura de maneira fiel e intensa.
Na cultura de uma empresa está a origem da manutenção de sua capacidade distintiva ou vantagem competitiva diferencial, o alicerce no qual se fundamenta sua estratégia e organização, o resultado de uma autêntica ação de liderança por parte de quem dirige a empresa, e a “escola” que forma os estilos de direção de seus futuros dirigentes.
2. Definição
A cultura de uma empresa estrutura-se em três níveis de elementos estritamente inter-relacionados, mas que podem sobressair individualmente em razão da importância da sua influencia na elaboração da estratégia e no modelo e governança da organização. Os três níveis são:
(a) O primeiro nível: os artefatos, formado por objetos visíveis, considerados tradicionais da empresa (por exemplo: móveis da sala do fundador, insígnias, marcas, determinadas formas de dividir e decoraro espaço físico, etc.) e por expressões audíveis habitualmente repetidas na empresa (como frases típicas, narrações de histórias de como as dificuldades foram superadas e o sucesso alcançado, etc.);
(b) O segundo nível: os valores, corresponde aos princípios operacionais peculiares e importantes que influenciam no momento de traçar as linhas de ação ou de decidir entre alternativas suficientemente comparáveis, dando preferência às atividades e decisões que mais estejam de acordo com os conceitos do desejável que cada valor significa para a empresa (por exemplo: a tendência a uma pequena diversificação, a inclinação à menor participação nas decisões, a auto-exigência por elevados níveis de qualidade etc.);
(c) O terceiro nível: os princípios, é formado pelos fundamentos mais profundos da maneira particular que uma empresa atua. Em alguns casos, esses fundamentos se consolidaram na maneira de decidir da organização, como resultado de ter validado suficientemente os valores, pois, ao agir repetidas vezes de acordo com eles, a organização encontrou soluções para problemas importantes (por exemplo, a tomada de decisões por consenso) e que, nos casos que puderem validar, são acordos alcançados pelo grupo sobre determinadas formas de atuar em circunstâncias imprevisíveis (por exemplo, um acordo entre os proprietários sobre as condições das futuras incorporações dos membros da geração seguinte).
3. Formação e evolução
Na empresa, assim como acontece em outros grupos humanos, a cultura é formada pelo compartilhamento de experiências e pela realização de um aprendizado em comum, principalmente por parte de quem lidera a organização e dos seus colaboradores mais importantes.
Nesse processo, prolongado no tempo, essas pessoas vão desenvolvendo, complementando e compartilhando seus valores, passando de uma soma de pessoa para um autêntico grupo que tem sentimentos e valores em comum (segundo nível da cultura). Conforme este grupo adquire mais experiência na resolução de problemas, definirá e estabelecerá princípios válidos para todos os membros (terceiro nível, o de maior profundidade da cultura).
Quando não ocorre esse processo, ou só se consegue uma parte dele, os dirigentes da empresa, mais que um grupo, forma um conjunto de individualidades unidas pela conjuntura, de modo que, pelo fato de assim serem, alcançam com mais facilidade determinados objetivos particulares, mas sem ter a firme vontade de continuarem unidos de maneira harmônica e duradoura.
Embora o processo de formação e desenvolvimento de uma cultura seja realizado por um grupo de pessoas, a influência de quem lidera é muito grande. Esse líder, ao ostentar o poder durante um período suficientemente prolongado, acaba moldando a cultura da organização com suas próprias preferências e estilos, o que pode nos levar a pensar que liderar uma empresa equivale a formar sua cultura e, quando ela já está formada, a transformá-la.
As épocas mais influentes nos processos de formação e evolução da cultura são aquelas em que a empresa passa por acontecimentos que podem ser críticos para sua continuidade, nos quais normalmente há a necessidade de tomar decisões que determinam o tipo de empresa que se quer ser a longo prazo e os associados que se quer ter.
Os acontecimentos críticos para a continuidade da empresa têm dois tipos de origens: o ambiente e a própria organização. As causas de uma ou de outra origem, que dão oportunidade para definir, desenvolver e pôr à prova a cultura de uma empresa, são, entre outras formas, as seguintes:
(a) Intensa mudança nos ciclos de atividades econômica;
(b) Mudança no ambiente de trabalho e sindical;
(c) Sucessão;
(d) Afastamento e admissão de dirigentes influentes;
(e) Novas situações na estrutura do mercado.
4. Transmissão
A transmissão da cultura às novas pessoas que entram para a organização exige uma atitude ativa para seu ensinamento e aprendizado. Para que a assimilação e a integração da cultura não fiquem exclusivamente no nível dos artefatos, seja por pensar que a imagem externa é o importante, seja pela segurança que os fatos históricos proporcionam, é preciso uma intensa e, às vezes, prolongada convivência entre os membros da geração precedente e as pessoas que se incorporaram. Essa convivência é uma oportunidade para realizar a forma de transmissão mais eficaz: a transmissão feita por meio do exemplo de vivenciar os valores em múltiplas decisões e de aplicar os princípios em situações delicadas.
Finalmente, ressaltamos com as empresas familiares apresentam grandes diferenças em relação às empresas não-familiares, no que se refere à sua cultura e no seu processo de formação.
As razões dessa diferença devem-se fundamentalmente, aos seguintes pontos:
(a) A empresa familiar tem mais grupos de interesses (sistema de proprietários, funcionários, membros da família) e maior número de inter-relações entre eles;
(b) Durante a primeira geração, e parcialmente na segunda, o poder na empresa familiar se apresenta de forma diferente. Geralmente varia em intensidade e duração;
(c) Os ciclos de evolução e desenvolvimento da empresa familiar estão relacionados com as necessidades variáveis dos membros da família que a dirigem e daqueles que possuem propriedade.
Bibliografia:
Casillas, José Carlos; Vázquez, Adolfo; Díaz, Carmen. Gestão da Empresa Familiar: conceitos, casos e soluções. São Paulo: Thompson Learning, 2007.